sábado, 27 de março de 2010

LEIDE CONSUELO QUEREZA MOREIRA - LIÇÕES DE UM OLHAR

AVE MARIA

Ave Maria cheia de graça
Mesmo rezando minha dor não passa

Santa Maria Mãe de Deus
Fazei feliz os dias meus


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MEU CAMINHO

No meu caminho da vida
Há uma grande encruzilhada
Não tem retorno só ida
Seguida de longa estrada

Nenhuma árvore florida
Nenhum pássaro cantando
Só a emoção sentida
Que vai se revelando


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O VIAJANTE

O viajante segue e caminha
Pelos atalhos da estrada
Eu também sigo sozinha
Pelas angústias do nada

Entre eu e o viajante
Há uma grande diferença
Enquanto ele segue distante
Eu para na minha descrença

Estamos tão separados
Com os sinais da saudade
E vamos assim calados
Atrás da felicidade


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Leide Consuelo Quereza Moreira escreve com a alma, através dos olhos. Ela tem todos os movimentos comprometidos, com exceção do globo ocular.

Sua poesia expressa sua angústia, mas transparece sua esperança, como uma forte luz, aonde busca sua força e resistência.

A doença que lhe tirou os movimentos é a Esclerose Lateral Amiotrófica, também conhecida como Síndrome de E.L.A, que é degenerativa do sistema nervoso, clinicamente caracterizada por paralisia motora progressiva incapacitante, ainda sem cura.

Em um ano, de 2004 a 2005, ficou com todos os movimentos comprometidos (com exceção do globo ocular)। Para se expressar utiliza uma tabela visual e com o apoio de colaborador treinado passou a construir poesias, primeiro, de forma tímida, depois ganhou relevância।

Em dezembro de 2006, Leide lançou seu primeiro livro, “Letras da Minha Emoção”, revelando-se uma poeta madura e sensível às questões humanas. Escreve e luta pela cura, pela vida, com o olhar.

Leia outras poesias suas em: www.leidemoreira.com.br
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quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

VIOLETA PARRA - DOU GRAÇAS À VIDA

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Dou graças à vida, que me tem dado tanto
Me deu dois olhos, que quando os levanto
Perfeitamente distingo o negro do branco
E entre todos, o homem que eu amo

Dou graças à vida, que me tem dado tanto
Me deu ouvido sensível e amplo
Que ouve, noite e dia, grilos e canários
Martírios, motores, latidos, jantares
E a voz tão terna do meu bem amado

Dou graças à vida, que me tem dado tanto
Meu deu os sons todos e o abecedário
com eles palavras, que penso e declamo:
Mãe, amigo, irmão e a sol iluminando
E o rumo d’ alma de quem estou amando

Dou graças à vida, que me tem dado tanto
Me deu a marcha para meus pés cansados
Com eles ando por cidades e charcos
Praias e desertos, montanhas e altiplanos
A casa aonde ele mora, sua rua e átrio

Dou graças à vida, que me tem dado tanto
Me deu um coração que se agita no peito
Quando vejo o que cria o cérebro humano
Quando vejo que o bem, o mal anula
Quando olho o fundo do teus olhos claros

Dou graças à vida, que me tem dado tanto
Me deu o sorriso e me deu o pranto
Se eu claro distingo amor e dano
Duas matérias que formam meu canto
O canto que é seu, que é meu próprio canto
O canto de todos é meu próprio canto

Gracias a la vida
Versão Célio Pires - direitos reservados


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Após um dramático final de um relacionamento amoroso, Violeta Parra suicidou-se em 5 de fevereiro de 1967, com 49 qanos, Dizem que se apaixonou por um jovem de dezessete anos, e até compôs outra música, Volver a los 17, como forma de expressar seu amor e sua vontade de voltar à idade de dezessete anos. O fracasso de um empreendimento e deste amor não correspondido a teriam levado ao suicídio.
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Violeta del Carmen Parra Sandoval nasceu em 4 de outubro de 1917, em uma modesta no Estado de Ñuble, na região de Chillán, ao sul do Chile. Seu pai era professor primário de música,e folclorista e sua mãe uma camponesa que cantava e tocava violão. Violeta trabalhou em circos e teatros e a partir de 1952, Violeta, impulsionada pelo irmão Nicanor Parra, começa a percorrer as zonas rurais, gravando e compilando música folclórica. Essa investigação a faz descobrir a poesia e o canto popular dos mais variados rincões do Chile. Elabora, assim, uma síntese cultural chilena e faz emergir a tradição de imensa riqueza até então escondida. Compõe canções, é pintora, escultora, bordadeira e ceramista.Em 1965, viaja à Suíça, onde filma um documentário que a mostra em toda a sua magnitude.
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terça-feira, 9 de dezembro de 2008

CONCEIÇÃO EVARISTO - EU-MULHER


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Uma gota de leite
me escorre entre os seios.
Uma mancha de sangue
me enfeita entre as pernas.
Meia palavra mordida
me foge da boca.
Vagos desejos insinuam esperanças.
Eu-mulher em rios vermelhos
inauguro a vida.
Em baixa voz
violento os tímpanos do mundo.
Antevejo.
Antecipo.
Antes-vivo
Antes - agora - o que há de vir.
Eu fêmea-matriz.
Eu força-motriz.
Eu-mulher
abrigo da semente
moto-contínuo
do mundo.

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MENINA

Menina, eu queria te compor
Em verso,
Cantar os desconcertantes
Mistérios
Que brincam em ti,
Mas teus contornos me
Escapolem.
Menina, meu poema primeiro,
Cuida de mim.

Do livro “Poemas da Recordação e Outros Movimentos”

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CONCEIÇÃO EVARISTO nasceu em Belo Horizonte/MG em 1946 e reside no Rio de Janeiro desde 1973. Formou-se em Letras (Português-Literaturas) pela UFRJ. Esteve como palestrante, em 1996, nas cidades de Viena e de Salzburgo/Áustria, falando sobre literatura afro-brasileira. Começou a trabalhar com 9 anos como empregada doméstica, foi para o RJ, onde foi lavadeira. È mestre em literatura pela PUC-RJ e faz doutorado em Literatura comparada na Universidade Federal Fluminense. Tinha 63 anos em 2008.

Nesta poesia todo o mistério e revelação do ser mulher, motriz-matriz da raça, de quem abriga a semente, inaugura a vida, entre dores, sangue entre as pernas.

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sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

ROSENA MURRAY - RECEITAS POÉTICA

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RECEITA DE ABRIR O CORAÇÃO

a chave é pequena
de ouro e coragem
o coração é labirinto viagem
muralha abismo trapézio
porta aberta par o outro
gaveta aberta para a vida



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RECEITA DE OLHAR

nas primeiras horas da manhã
desamarre o olhar
deixe que se derrame
sobre todas as coisas belas
o mundo é sempre novo
e a terra dança e acorda
em acordes de sol

faça do seu olhar imensa caravela



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Bons e diversos ingredientes combinados resultam em delícias que deleitam e saciam vontades. Roseana Muray faz receitas poética precisas e saborosas. Seu livro, Receitas de Olhar, é um livro voltado ao público juvenil que atinge a todos. É, assim, algo bom de se degustar.
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